Em entrevista ao IJCA, o professor, escritor e filósofo Renato Noguera compartilhou um pouco de sua trajetória e falou sobre a importância do afeto e da esperança para superação de desafios sociais. Renato Noguera participou da abertura da 13ª Mostra de Trabalho do IJCA com a palestra “Afetos e trabalho: onde está o que você sente”.
Renato Noguera é Doutor em Filosofia e professor na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Noguera é ensaísta e, dentre suas obras, vale destacar “Ensino de Filosofia e a Lei 10639”, “Por que amamos: o que os mitos e a filosofia têm a dizer sobre o amor” e “O que é o luto?”
Instituto JCA: Pode nos contar um pouco sobre sua trajetória, da escola até a professor universitário e escritor, e como ela pode inspirar jovens de origem periférica?
Renato Noguera: Eu sempre tive curiosidade, mas tive muito apoio e suporte de várias pessoas. Eu estudei na Escola Municipal Waldemiro Potsch até o atual 5º ano. Depois,minha mãe me inscreveu para o concurso do Colégio Pedro II (CPII), eu fiz um breve preparatório com a Tia Lúcia, uma professora que dava reforço escolar. Eu iniciei o curso de Filosofia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 1991, aos 18 anos. Eu comecei o mestrado aos 22 anos em 1995 na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), mas por vários fatores acabei abandonando e prestei nova seleção no ano seguinte e recomecei o mestrado no Programa de Filosofia e Epistemologia da Psicologia e da Psicanálise da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Na época, o curso durava quatro anos, conclui em 2000 e na sequência entrei no doutorado em Filosofia na UFRJ. O percurso não foi fácil, mas eu persistia, insistia, errava, acertava, errava novamente. Não ter medo de errar. Em paralelo, fiz cursos de escrita na UFRJ entre 1992 e 1993 em um curso de extensão na Faculdade de Letras. Em 1994 e 1995, eu fiz curso de escrita com João Gilberto Noll, escritor gaúcho premiado. Ele me perguntou se eu escrevia por excesso ou por falta. Eu respondi: excesso. Ele disse, por falta. No ano de 1991, eu participei do Coletivo de Estudantes Universitárias e Universitários Negras e Negros (CENUN), um espaço de muito aprendizado e letramento racial antirracista. Ter apoio e fazer parte de grupos, sejam políticos, culturais, terapêuticos, familiares, foi um importante suporte.
Instituto JCA: Hoje, a nossa juventude negra vive um contexto de opressão e violência. Como estudar filosofia em uma perspectiva afrocentrada pode apoiar jovens negras e negros de periferia?
Renato Noguera: O ato de estudar filosofia, numa perspectiva afrocentrada, pode contribuir para fazer boas perguntas sobre a vida, aguçar a curiosidade e criar condições de repensar a jornada num contexto social e político racista. Filosofia é um exercício espiritual, isto é, uma prática intelectual, colocar o pensamento em atividade para ampliar o conhecimento de si. A filosofia afroperspectivista estimula mais autointimidade. Em linhas gerais, mais intimidade consigo pode contribuir para que jovens negras e negros de periferia possam se organizar melhor.
Instituto JCA: Ainda falando desse contexto de opressão e violência, como podemos atuar para que as organizações que trabalham com educação de jovens (sejam escolas ou do terceiro setor) possam ser catalisadores de esperança?
Renato Noguera: É muito importante ter instituições parceiras para oferecer suporte. Essas organizações são fundamentais para oferecer repertório e informar a juventude sobre oportunidades e desafios. Informar sobre um curso, sobre uma vaga de emprego, estimular sonhos e contribuir para que jovens se organizem mais. É importante fazer uma escuta ativa dos jovens, saber sobre os seus desejos, suas angústias. Isso ajuda a conjugar o verbo esperançar. E, por parte dos jovens, vale a pena definir metas, refazer, planejar, pedir e aceitar apoio.
Instituto JCA: Por que é tão importante falar de afeto, amor e esperança nos dias de hoje?
Renato Noguera: Nós precisamos lidar cada vez mais com conflitos armados em várias partes do mundo. Nós precisamos de acolhimento, amor e esperança, que são afetos importantes. O amor aumenta a conexão consigo, a consciência de si; a esperança nos inspira para rumos futuros, tornando o presente uma oportunidade. Esperançar é fazer o melhor no tempo presente, no aqui e agora. Esperançar implica em ter mais confiança no presente para encontrar um futuro mais bonito e feliz.